O objetivo dos boletins da SOLVER é incentivar o aprofundamento na legislação trabalhista, informar sobre as alterações legais, dar dicas operacionais e eventualmente mostrar sobre como será tratado o assunto no nosso sistema PERSONNEL XXI.
Teremos boletins TRABALHISTA semanais com assuntos variados e boletins EXTRAORDINÁRIO quando houver alterações legais. Ambos não têm o caráter de consultoria jurídica, mesmo porque não somos consultores jurídicos, somos uma empresa de software e BPO de Folha de pagamento.
Acidente de trabalho em home office é possível?
1. Introdução
Com a pandemia, muitas coisas mudaram, em especial, a nossa rotina diária de trabalho.
Isso porque muitas pessoas passaram a trabalhar no home office e tornou-se uma realidade para muitas empresas.
Desde 2020, as atividades econômicas não essenciais pararam o seu funcionamento ou, ainda, tiveram de se organizar para não parar de alguma forma, enquanto as essenciais tiveram algumas alterações para se manter.
2. O que é Home Office?
O home office é uma forma de relação de trabalho na qual o colaborador atua à distância.
O trabalho em domicílio, conhecido como home office, nada mais é do que uma espécie do gênero “trabalho à distância”, que é assim designado porque é realizado necessariamente na moradia do empregado, abrangendo não só o trabalho realizado com recursos tecnológicos, mas também trabalhos manuais.
Contudo, o home office não se confunde com teletrabalho, pois este último pode ser realizado em qualquer lugar e não somente na residência do empregado.
A previsão legal sobre a possibilidade de trabalho em regime de home office, encontra-se no artigo 6° da CLT:
Art. 6o Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.
Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio.
Sendo assim, o home office pode ser realizado e não tem diferença entre o trabalho na empresa ou na casa do empregado.
Então, é possível caracterizar os acidentes que possam ocorrer em casa durante o trabalho remoto como acidente do trabalho?
A resposta é sim, pois mesmo estando em casa, é possível caracterizar como acidente de trabalho possíveis situações acidentais que ocorram durante a execução do serviço em casa.
3. O que é o acidente do trabalho?
É qualquer acidente que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou de empregador doméstico, provocando lesão corporal (membros quebrados, lesões na coluna e afins) ou perturbação funcional (doenças como lesão por esforço repetitivo etc.) que cause a morte ou a perda ou redução da capacidade para o trabalho, seja ela permanente ou temporária (art. 19 da Lei nº 8.213/91).
Pode ser caracterizado independente de o trabalhador estar exercendo sua função na sede da empresa ou em outro local, como em casa e como exemplo podemos mencionar o empregado que tropeça na cadeira de trabalho e quebra um dedo ao cair no chão de mau jeito.
Também são consideradas acidentes de trabalho, a doença profissional, que é aquela produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e a doença do trabalho que é aquela desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado.
Podem caracterizar-se como doenças ocupacionais, as doenças como depressão, transtorno de ansiedade, síndrome de burnout, entre outras.
Juridicamente falando, não existe uma lista específica de doenças que se encaixam nessa categoria, ou seja, qualquer patologia originada ou agravada pelo trabalho é considerada uma doença do trabalho.
4. Acidente de trabalho em home office
Muitos trabalhadores podem ter dúvidas no sentido de como comprovar que o acidente ocorreu durante o trabalho e não por outro fator.
Vale lembrar que o fato de a prestação de trabalho estar sendo realizada de casa não desobriga o empregador de zelar pela saúde de seus colaboradores, porque a lei lhe atribui diversos deveres atinentes a higiene, segurança e saúde de seus empregados, não importando onde o trabalho é realizado.
O Ministério do Trabalho estabelece procedimentos relacionados à saúde e segurança do trabalhador, onde tais regras também são aplicadas ao home office.
Apesar de o empregado estar em casa, ele está executando tarefas em benefício da empresa, logo, sob a sua responsabilidade.
Além disso, é dever do empregador instruir os empregados quanto às precauções a tomar com a finalidade de evitar doenças ocupacionais e acidentes de trabalho, como pausas necessárias, a depender das tarefas, mobília adequada, ginástica laboral entre outras orientações que possam ajudar a prevenir a doença ou acidente de trabalho.
Portanto, mesmo que você sofra um acidente durante o trabalho em home office, pode haver responsabilidade da empresa.
No entanto, é necessário comprovar que esse acidente tenha relação direta com o trabalho exercido em casa.
5. Principais fatores que causam acidente de trabalho em home office
Quando falamos do cenário de home office, nos referimos a um cenário diferente do que o trabalhador está acostumado a atuar, onde normalmente pode haver mais possibilidades de acidentes.
Porém, outros fatores podem contribuir para um acidente de trabalho quando o empregado está atuando em casa, pois nem sempre a empresa faz as orientações necessárias para que essa estadia seja o mais saudável possível.
Infelizmente, nem toda empresa fornece os aparatos necessários, fazendo com que o colaborador muitas vezes improvise um escritório em casa.
Abaixo, segue alguns exemplos dos principais fatores que causam acidente de trabalho em casa:
- Uso de mobiliário antiergonômico: muitas pessoas não possuem as cadeiras adequadas em casa para uma rotina de trabalho. As cadeiras ergonômicas (as mais indicadas) permitem uma postura melhor e, portanto, são indispensáveis. Um mobiliário antiergonômico pode resultar em dores e lesões ao empregado.
- Posturas estáticas, inadequadas e prolongadas: durante o home office, o colaborador pode ficar muitas vezes na mesma posição durante longos períodos. Sem as devidas orientações de pausas ou ginásticas laborais, este pode ter sua saúde física comprometida;
- Falta de suporte para notebook/computador para o nível dos olhos: quando isso acontece, o trabalhador precisa fazer “manobras” para conseguir usar o equipamento de forma a ser produtivo, tornando a atividade cansativa e gerando consequências ao longo do tempo.
- Longas jornadas de trabalho: muitos trabalhadores, por estarem em casa, acabam ultrapassando sua jornada de trabalho por exigências de seus empregadores que, erroneamente, consideram a jornada em casa mais leve e consequentemente, passível de ser prolongada como forma de “compensação”. Essa sobrecarga pode acarretar doenças psicológicas, como estresse, burnout, entre outras.
- Múltiplas tarefas e alta produtividade: ainda como consequência de uma visão deturpada de que o trabalho feito em casa é mais leve, alguns empregadores desenvolvem o hábito de cobrar mais produtividade e acumular tarefas para o empregado. Esse tipo de cobrança também resulta em prejuízos na saúde do colaborador.
Além disso, outras situações podem surgir ao longo do trabalho remoto, como o excesso de videoconferências, cobrança abusiva de metas, entre outras, que resultam no abalo psicológico do trabalhador, favorecendo de forma significativa o seu adoecimento.
6. Deveres do empregador
- a) Propiciar um ambiente de trabalho adequado, como mobília, equipamentos, entre outros, que permita ao colaborador executar seu trabalho de forma saudável;
- b) Orientar quanto às precauções a serem tomadas com a finalidade de prevenir acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais;
- c) Cientificar o empregado e colher assinatura em termo de responsabilidade quanto às diretrizes e orientações de comportamento seguro no trabalho;
- d) Fiscalizar periodicamente o cumprimento das regras, podendo aplicar penalidades.
Portanto, é importante o empregador instruir adequada e exaustivamente o empregado a respeito de ergonomia (postos de trabalho ergonomicamente adaptado), fazer pausas para a alimentação e descanso, realizar exercícios de relaxamento e alongamento (ginástica laboral), não realizar jornadas longas, fornecer equipamentos adequados, dentre outros.
Para o empregador se assegurar que o empregado está seguindo as instruções fornecidas quanto às normas de saúde, higiene e segurança no trabalho em domicílio, precisará fiscalizar o local de trabalho remotamente (por câmeras) ou presencialmente, o que encontra obstáculos em face dos direitos do empregado à inviolabilidade de domicílio e o respeito à sua privacidade e intimidade.
O Enunciado 23 do XIX do Congresso Nacional dos Magistrados do Trabalho da Justiça do Trabalho (Conamat) traz importante orientação a respeito dessa questão, ao estabelecer que, sempre que o teletrabalho “seja realizado no domicílio do trabalhador, a visita ao local de trabalho para fins de fiscalização do meio ambiente laboral deverá se dar:
- com a anuência e presença do empregado ou de alguém por ele indicado;
- a visita ao local de trabalho só deve ter por objeto o controle da atividade laboral, bem como dos instrumentos de trabalho;
- em horário comercial, segundo os usos e costumes do local;
- com respeito aos direitos fundamentais (intimidade e vida privada) do empregado”.
7. Deveres do empregado
Ao passo que o empregador cumpriu todos os deveres exigidos com o colaborador em home office, é importante destacar também que este possui responsabilidades a serem cumpridas, pois, ao ficar comprovado que o trabalhador não cumpriu efetivamente as diretrizes e orientações da empresa, esta não terá mais responsabilidades atreladas a si, visto que cumpriu o seu papel de forma correta.
Caso o empregado não cumpra fielmente as orientações do empregador, poderá sofrer penalidades disciplinares (advertência, suspensão e até dispensa por justa causa).
8. Sofri acidente em casa. E agora?
Estando caracterizado o acidente de trabalho ou a doença do trabalho, a lei assegura ao trabalhador que estava em casa os mesmos direitos que assegura a quem se acidentou ou adoeceu trabalhando no espaço físico da empresa. São eles:
- Emissão do CAT pela empresa (Comunicação de Acidente do Trabalho);
- Auxílio-doença acidentário (ao ficar mais de 15 dias afastado);
- Estabilidade de 12 meses a partir da alta previdenciária ou indenização substitutiva;
- Recolhimento do FGTS no período do afastamento, independentemente da quantidade de tempo;
- Por ter comprometido a saúde, indenização por dano moral e material (despesas com tratamento, plano de saúde e pensionamento) desde que deferida por ação judicial.
Matéria elaborada conforme a legislação vigente à época de sua publicação e estará sujeita a alterações em caso de mudanças na legislação.